Quando os anjos choram

Por alguns segundos os anjos me invejam. Pelo menos por um dia eles queriam ser eu, queriam amar da forma que amo, ter defeitos, usar protetor solar, sofrer de indecisão, desesperança e impaciência, sentir medo do escuro, sentir o cheiro da chuva misturado ao cheiro da terra, xingar o cara no trânsito, pingar colírio no olho irritado, sentir fome de pão e sede de música. Sinto que no olhar dos anjos tem pinceladas de tristeza, e acredito que pelo menos por pouco tempo um anjo gostaria de saber como é ser feliz, ser feliz daquele jeito em que a gente não cabe dentro da gente, em que esperar a hora passar vira um pesadelo sem fim.

Os anjos não choram e quando choram, suas lágrimas viram chuva. Eu choro de vez em quando, eu sangro e sinto dor no corpo e na alma, mas os anjos nem sequer sangram e o bater de suas asas branquinhas ventila uma tarde ensolarada de domingo. Os anjos são sempre eternos, enquanto que eu não passo de um suspiro demorado de Deus e minha vida é a duração de uma batida do seu coração.

Possivelmente, algum anjo me contou tudo isso noite passada. Ele trocaria tudo isso pela delicia de saber como que é amar você. Se um anjo soubesse amar, talvez eu até quisesse ser um anjo, mas com uma única condição: te encontrar de novo na vida

Allê Barbosa

10 de Dezembro de 2007